“Entro na casa onde nasci
O tempo emprestou sem dó uma cor
Amarelada às suas
paredes.” ______Manoel De Barros
A porta aberta deixava entrar em suas paredes nuas um vento
frio e calmo. Entardecia... E o céu tinha cores rubras e cinzas. Fui entrando devagarinho
naquele santuário... Passei meus olhos pelos lugares onde antes ficava a
máquina de costura, os quadros e retratos da família. Entrei silenciosamente
nos quartos e ali ainda encontrei vestígios da vida que ali vivi. Algumas folhas soltas
dos cadernos, pedaço de uma história que tinha ido embora... Uma mala... Tinha
uma mala naquele quarto antes habitado por nós, Num frenesi de ansiedade
procurei ver o que ali restava. O amarelado do tempo se fazia imperar... As
calçadas altas com os seus degraus
estavam em ruínas, e naquele tarde o meu coração também. As lembranças jorravam
em turbilhões... eram vozes, cheiros, sabores, tudo vinha engolfando-se,
sobressaindo-se nos sentidos aguçados pela solidão da tarde... Os terreiros de
terra vermelha, os currais, as árvores e o grande juazeiro do quintal já não
estavam ali, apenas o mourão se mostrara resistente ao tempo que passou... para
onde fomos todos? Outras construções,
outros vizinhos foram chegando... Parei no meio do silêncio, aquietei a tarde
dentro de mim e fui embora sem coragem de olhar para trás porque sei que as
lembranças acenariam e eu já havia guardado todas na mala que ficou no canto
esquecida...